No dia 26 de julho de 2018 foi realizada a oficina “Limites, disciplina e punição nos serviços de acolhimento: do que estamos falando, com a participação das especialistas Madza Ednir e Yara Saião.

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O encontro foi iniciado com uma atividade dirigida pela equipe de formação do Instituto Fazendo História, na qual cada participante, a partir da leitura de algumas frases, deveria se manifestar levantando a mãe para CONCORDA, DISCORDA ou TENHO DÚVIDAS. A partir dessa atividade, foi possível fazer um pequeno mapeamento das principais dificuldades enfrentadas pelos participantes com relação aos limites nos serviços de acolhimento.

 Assim, Yara Saião prosseguiu o encontro contado sua experiência na FEBEM em SP na década de 80, que tinha de 500 a 600 crianças acolhidas. Yara fala sobre a importância do Estatuto da Criança e do Adolescente e sobre como ela foi aprovada em 1990 a partir do movimento de muitas pessoas e profissionais atuantes na área, que brigaram para defender os direitos da criança e do adolescente, os colocando como prioridade absoluta. Segundo Yara, todos que trabalham em um serviço de acolhimento são guardiões desta lei: tem que respeitar e fazer valer.

Quem são as crianças e adolescentes que estão em Serviços de Acolhimento?

Mesmo sem ler o prontuário, sem sabermos nada sobre as crianças, sabemos que viveram algum tipo de violência (física, sexual e outros tipos como humilhação, falta de cuidado, etc). As histórias já vividas deixam marcas e são diferentes de sujeito para sujeito. Muitas vezes sabemos disso, mas esquecemos na hora de pensar em uma punição ou contenção para as situações que acontecem no cotidiano. Principalmente quando a criança acaba de chegar em um serviço, ela está se sentindo como se estivesse caindo em um país estrangeiro. Não é possível que ela consiga ainda respeitar regras.

Segundo Yara, para se começar a pensar em limites é preciso lembrar que são essas crianças as que estamos trabalhando. Muitas vezes o comportamento de uma criança é reativo, ela está lidando e tentando elaborar as violências que já viveu. Preciso entender e compreender a serviço de que está o comportamento de cada criança para pensarmos que tipo de limite ela precisa. Entender é diferente de aceitar.

A palavra LIMITE tem a ver com controle, regra, combinados, grupo, proteção, respeito, afeto, autonomia, estratégias, espaço, sociedade, educação. Educar é incluir em uma sociedade. É preciso pensar estratégias para trabalhar o limite e incluir na sociedade, tomando o cuidado para não utilizar estratégias que excluam. A função do limite é dar ferramentas para que as crianças conheçam e compreendam a nossa cultura. Com relação a estratégias como por exemplo não ir no passeio, Yara explica que a punição ou sanção deve fazer sentido para reparar a transgressão ocorrida. Quanto mais a sanção estiver relacionada ao ato, mais chances de funcionar. No caso de punições que isolam as crianças, mais chances de sentirem raiva e reagirem a isso. É importante lembrar que educar não é produzir obediência. As estratégias não podem ser pensadas por uma pessoa só – deve haver reuniões e discussões de caso em equipe, evitando que nossos valores pessoais se sobreponham ao nosso papel profissional.

A meta de toda punição deve ser fazer a criança ou adolescente reparar o dano que ela causou com a transgressão. Quanto mais amorosidade e tranquilidade um educador tiver na hora de colocar um limite, mais chances dele funcionar.

A segunda especialista, Madza Ednir, inicia sua fala, trazendo sua experiência de implantação do projeto de Justiça Restaurativa em escolas de São Caetano.

DIALOGOS quer dizer aquilo que se faz por meio da palavra. Diálogo é aquilo que aproxima – é o contrário da violência. Quanto mais diálogo existir maior é o vínculo que se forma. A partir de uma vivência, Madza convoca cada participante a resgatar uma pessoa em sua vida que foi importante e transformadora e, assim, faz cada um pensar em seu papel de educador, que é extremamente importante na formação das crianças e adolescentes. Citando Paulo Freire, “Ninguém educa ninguém e ninguém se educa sozinho. As pessoas se educam umas as outras em comunhão, mediatizadas pelo mundo, pela realidade”

Justiça restaurativa é um projeto que propõe um nova forma de justiça – que promove o diálogo e restaura, ao contrário da justiça que define o certo e o errado e pune.

Diálogo, respeito mútuo, responsabilidade e trabalho em rede são os princípios principais da Justiça Restaurativa. O foco não é a punição, mas sim a reparação do que foi prejudicado por uma situação de violência. Dr Juiz Eduardo Melo, em Sâo Caetano decidiu em 2005 implantar o projeto Justiça Restaurativa nas escolas, pois os conflitos estavam sendo tratados de formas cada vez mais drásticas, chegando até a criminalizar os adolescentes, fazendo Boletins de Ocorrência.

Segundo Madza, toda vez que elaboramos um conflito estamos ensinando alguma coisa. Se punimos um ato violento de forma violenta, estamos ensinando que problemas se resolvem com violência. Os papéis de agressores e agredidos são fluidos. Muitas vezes o agressor também estava sendo agredido. A consequência dos círculos restaurativo é a restauração da humanidade nos envolvidos.

Toda violência traz um desequilíbrio, pois despeitada necessidades básicas dos indivíduos: necessidades de relação (de pertencer), de competência (sentir capaz de alguma coisa), de autonomia. Para satisfazer essas necessidades básicas, em nossas instituições, precisamos realizar ações que promovam interação, dar instruções para o desenvolvimento de competências e valoriza-las, ações de gerenciamento e organização para que as pessoas desenvolvam autonomia. Quanto mais as escolhas as crianças tiverem mais vão desenvolver autonomia, De acordo com Madza, a agressividade, quando há apoio, pode ser transformada em criatividade. Os recursos artísticos como grafite, música, dança, desenho, cinema, etc, podem auxiliar no fortalecimento das crianças e adolescentes e transformação das situações violentas. Madza também apresentou exemplos práticos de como prevenir e tratar situações de violência, como por exemplo organização do espaço, a realização de círculos restaurativos e círculos de paz.

Assista aos vídeos da oficina: